Um olhar superficial e distraído pode nos levar a pensar que sim, mudou! Crianças estão mais sedentárias, conectadas digitalmente, conversando e interagindo sobre diversos assuntos, consumindo alimentos processados, industrializados e com uma gama de novos interesses. A pediatria vê hoje nos seus consultórios patologias e dificuldades que só eram vistas nas clínicas médicas de adulto: hipertensão, hipercolesterolemia, AVCs, síndrome metabólica, obesidade mórbida, depressão, síndrome do pânico…

A pandemia salientou mais ainda as mudanças que já estavam em andamento nos últimos anos: o aumento de horas na frente das telas, sedentarismo e obesidade. Porém, a pandemia trouxe também a necessidade das famílias terem que conviver muitas horas do dia juntas e um novo olhar mais atento começou a surgir.

Valores esquecidos foram resgatados e a criatividade começou a aparecer. Divisão de tarefas, tempo em família no chão da sala, almoços ao redor da mesa, jogos de tabuleiro, jardinagem, contemplação de aves, pequenos momentos que antes não eram percebidos nem valorizados tornaram-se conquistas importantes.

E é aí que quero chegar! Podemos enxergar dentro das crianças e ver que a infância NÃO mudou! A era digital não apaga a necessidade de abraço, beijo, olho no olho, afeto... A infância segue igual em suas necessidades básicas de atenção e amor! Atenção verdadeira, em que é preciso tempo e é fundamental parar de olhar para a tela do celular e mostrar total interesse por aquele que está na sua frente! A pandemia trouxe as horas necessárias para que pudéssemos resgatar a infância adormecida.

A infância sempre será a base trabalhada em família, desde o momento da geração do feto até a adolescência, não pode ser terceirizada e nem trabalhada somente na escola de educação infantil, ensino fundamental ou nas rodas de amigos adolescentes. Na família estão os protagonistas principais desta história de afeto, educação e crescimento. Parece claro e natural? Mas muitas vezes não é, e o que vemos são bebês e crianças abandonadas com famílias presentes…

Precisamos estar atentos, valorizarmos a infância e a família, buscarmos o tempo com qualidade nos relacionamentos, fortalecermos os vínculos afetivos!

A pediatria tem responsabilidade nesta hora, pois é muitas vezes a linha de frente para situações que precisam ser vistas com urgência! Vínculos mãe-bebê, pai-bebê, amamentação, estimulação, prevenção da violência, depressões, comportamentos anti-sociais e outros. A pediatria tem de ser protagonista e todas as crianças precisam ter acesso ao pediatra. O médico pediatra é o primeiro amigo e protetor da criança e sua família.

A infância não mudou! O olhar de uma criança pedindo atenção segue o mesmo! O sorriso franco, a ingenuidade e a pureza seguem tendo que ser protegidos! A infância é o nosso bem mais precioso! E dela depende o nosso futuro!

Liane Netto
Pediatra

“A infância é o chão sobre o qual caminharemos pelo resto de nossas vidas.”
Lya Luft