Dr. Harry Quadros de Oliveira

Completando um século de vida nesse dia 15 de agosto, o doutor Harry dedicou-se de corpo e alma a atender e curar pessoas que precisavam de sua assistência médica. Em Seara, SC, onde se instalou depois de formado, abriu um hospital comunitário e viveu experiências memoráveis, que só poderiam mesmo ser vividas naqueles meados do Século XX, em que os deslocamentos se faziam a cavalo ou de barco, e em que a paga era um porco, uma galinha, ou um eterno agradecimento.

Nascido em Dom Pedrito e criado em Rosário do Sul, o jovem Harry teve uma infância repleta de vivências. Cedo, foi trabalhar com o pai na farmácia, onde começou seu envolvimento com as lides da medicina. Em Rosário, trabalhando como mandalete na Swift Armour, aproveitou para aprender inglês. O pai abriu um cinema. A orquestra que dava o fundo sonoro para os filmes mudos era composta pela família e Harry aprendeu a tocar violino. A casa dos Oliveira era uma referência cultural na cidade e recebia os artistas que viajavam para a região. O compositor Ernesto Nazareth, autor de "Odeon", tocou piano na residência da família em algumas oportunidades.

Depois de cursar o colégio La Salle, em Santa Maria, mudou-se para Porto Alegre e ingressou na Faculdade de Medicina da UFRGS, tendo sido aluno dos professores Raul Moreira, Décio Martins Costa e Osmar Pilla, Fundadores da SPRS.

Com 25 anos, formado em Medicina, foi trabalhar em Nova Milano (SC), um povoado que após alguns anos se tornaria o município de Seara. Os instrumentos para o trabalho foram comprados pela comunidade e o Dr. Harry passou a atender na pensão onde morava, transformada em um pequeno hospital. Em alguns anos, novamente a comunidade se mobilizou para construir o primeiro hospital, onde o Dr. Harry pode atender melhor os pacientes da região.

Atento às oportunidades da vida, numa das inúmeras vezes em que viajava ao centro do país para fazer cursos e se especializar, acabou auxiliando um professor palestrante americano com a tradução. Ao final do encontro foi convidado a estudar nos Estados Unidos, ao que ele prontamente respondeu que sim. “Achei que era algo só de momento, mas passado algum tempo chegou o convite para ir me especializar naquele país e eu optei por Pediatria.” Nos Estado Unidos conheceu Waldo Nelson e teve oportunidade de fazer a residência no hospital Torrington, em Connecticut, onde também trabalhava como enfermeira a futura esposa.

Em 1954, casado com dona Lydia, voltou para Seara, onde por nove anos exerceu a medicina com paixão, participou da criação do município e contribuiu com o desenvolvimento da cidade. “Os anos mais felizes da minha vida eu passei em Seara. Eu trabalhava muito e o tempo passou rápido. Em Porto Alegre foi diferente. Muito corrido, muito disputado.” – lembra, explicando que veio para a capital para dar oportunidade de estudo para os seis filhos.

Harry havia trazido dos Estados Unidos seu Cadillac, que logo vendeu para um cirurgião. Com o dinheiro, comprou ações do Hospital Fêmina, que estava sendo construído em Porto Alegre. Voltando à Porto Alegre, passou a atender no berçário do Hospital Fêmina, mas acabou vendendo suas ações quando o hospital saiu do controle dos médicos. Abriu uma clínica em Canoas, onde também trabalhou na Base Aérea.

Das quase sete décadas em que trabalhou como médico, Harry traz como grande ensinamento as palavras de um de seus ídolos, Albert Schweitzer: “O propósito da vida humana é servir e demonstrar compaixão e vontade de ajudar os outros.”

O grande orgulho da vida de Harry foi constituir uma família unida, feliz, e que gosta de confraternizar. Os 100 anos serão comemorados com uma reunião de toda a família e a edição de um livro, escrito pelo jornalista Victor Lourenço, que conta a trajetória do Doutor Harry. Além das entrevistas com o médico, Lourenço reconstituiu os passos deste clínico geral e pediatra a partir de entrevistas e depoimentos de familiares, amigos e dezenas de pessoas de Seara, que tiveram suas vidas influenciadas pelo Dr. Harry.

Orgulhosa de seu associado que foi um dos precursores da Pediatria no nosso estado, a SPRS visitou o Dr. Harry para uma conversa agradável sobre os momentos memoráveis de sua prática profissional e foi agraciada com um exemplar do livro “A travessia de Harry, o médico centenário”. A entrevista com o Doutor Harry será publicada na edição de agosto do Jornal da SPRS.
 

 Texto e fotos: Marcos Silva Matte